terça-feira, 17 de agosto de 2010

Internacional: Clube do Povo?

Prestes a conquistar sua segunda Libertadores, o Inter mostra que as políticas adotadas nos últimos anos atingiram os objetivos propostos: alçar o clube a uma condição vencedora e consolidar-se no cenário como exemplo de eficiência administrativa que se traduz em títulos. Para tanto, foi preciso preparar-se para este novo capítulo na história colorada de forma gradual. Grandes títulos não surgem ao acaso, e a administração do clube sabia disso ao assumir, em 2002, quando a chapa de oposição ganhou as eleições tendo Fernando Carvalho à frente.

Da lama ao caos

Aquele ano não foi fácil. O Inter jogou um péssimo campeonato brasileiro e foi para a última rodada precisando vencer o Paysandu para escapar do rebaixamento na cancha adversária. Ibsen Pinheiro fazia parte da gestão. Sobre o jogo, a Folha de São Paulo publicou: “Torcedores (do Paysandu) xingaram o presidente José Artur Guedes Tourinho e cobravam ‘raça’ do time, que demonstrou apatia em campo. Parte da torcida já havia deixado o campo antes mesmo do final do jogo revoltada com a postura da equipe diante do Internacional”. Com gols de Mahicon Librelato e Fernando Baiano, o Inter se livrava do descenso de forma dramática e controversa.

Os procedimentos para que o Inter retomasse o rumo das vitórias, contemplavam a liquidação de dívidas, a valorização de jogadores surgidos na base para vendê-los ao mercado europeu e o crescimento do quadro social. Em 2002, isto parecia distante.

O clube do povo

Nascido em 1909 pelas mãos dos irmãos Henrique Poppe Leão e Luiz Madeira Poppe, o Sport Club Internacional surgiu como uma reação ao elitista Grêmio, fundado seis anos antes. A proposta era abrir as portas a todos, sem discriminação. Se o Grêmio era o clube dos que tinham origens germânicas, o novo clube teria amplitude irrestrita, internacionalizando o futebol. É assim que a história do clube vem sendo contada, e disto o torcedor colorado sempre se orgulhou. O Inter era popular, antes de tudo.

O Clube do Povo construiu seu estádio com a colaboração da torcida, que carregava tijolos, cimento e ferro para viabilizar a construção do imponente Beira-Rio, inaugurado nos idos de 69, após dez anos de obras e doações.

Fiel a suas origens, o Inter se manteve um clube aberto ao longo dos anos, e assim alcançou sua grandeza, com períodos de supremacia regional jamais igualados pelo rival. Montou um verdadeiro esquadrão nos anos 70, quando revelou craques e empilhou títulos derrubando todos que aparecessem a sua frente. Não é preciso dizer que as conquistas do campo massificaram ainda mais o contingente de torcedores colorados.

O ápice

O Inter chegou à Libertadores de 2006 como o vice-campeão brasileiro do ano anterior, após um conturbado campeonato que honrou a tradição brasileira de organizar bagunças espetaculares, com mudança de resultados e anulação de partidas. Interpéries à parte, o time foi para a disputa continental sendo treinado por Abel Braga, que herdou uma equipe muito bem montada por Muricy Ramalho. A mescla entre experiência e juventude era perfeita, e havia também a liderança e o carisma de Fernando Carvalho, presidente do clube e exímio conhecedor de futebol. Com uma campanha incontestável, o Inter superou o São Paulo na final, chegando a seu primeiro título internacional.

A nova era colorada seria coroada com a vitória no mundial interclubes, ocasião em que seria preciso derrotar o campeão europeu, o temido Barcelona. Mesmo desfalcado (Eto e Messi estavam machucados), o clube catalão contava com o favoritismo unânime, mas dentro de campo, isto não se traduziu em bom futebol. Com gol de Adriano Gabirú, o Inter derrubou o gigante Barça e ergueu o troféu mais importante de sua história.

Quebra de paradigma

Quem chega ao topo, depara-se com um novo desafio: manter-se lá; acomodar-se nas almofadas macias da glória. Além disso, é difícil voltar para a classe econômica depois de experimentar a lagosta da primeira classe. Para tanto, é necessário ampliar receitas, já que o custo do sucesso é alto.

As medidas tomadas a partir de 2006, no sentido de manter o Internacional na rota das grandes consquistas, dissociam o clube da sua tradição popular. A principal delas, ampliar o quadro social até alcançar a incrível marca de 100 mil sócios, o dobro da capacidade de seu estádio, é a que mais corrompe a imagem de “clube do povo” construída no passado (cada vez mais) remoto. Hoje, é difícil conseguir ingresso para assistir a um jogo do Inter – é preciso que um sócio desista -, assim como um simples passeio pelo Beira-Rio, construído com os tijolos de seus velhos torcedores, custa hoje R$ 20.

Hoje, o multicampeão se divorciou do torcedor humilde, o que pode ser constatado pela pesquisa realizada recentemente pelo IBOPE sobre as maiores torcidas do Brasil:

ENTRE OS MAIS POBRES (Renda mensal de até 1 salário mínimo)   
1º) Flamengo - 22%
2º) Corinthians - 10,6%
3º) São Paulo - 6,8%
4º) Palmeiras - 5,4%
5º) Vasco - 3,5%
6º) Sport - 3,4%
7º) Grêmio - 2,6%
8º) Bahia - 2,4%
9º) Fortaleza - 2%
10º) Cruzeiro - 1,8%
11º) Fluminense - 1,5%
12º) Santos - 1,3%
13º) Ceará - 1,3%
14º) Vitória - 1,2%
15º) Atlético-MG - 0,8%   







O Internacional, outrora conhecido como o Clube do Povo, não aparece entre as 15 maiores torcidas do país entre os que recebem até 1 salário mínimo.
O quadro geral de torcidas pode ser visto aqui.

Claramente, a política que leva o clube a grandes conquistas, também traz como resultado o encolhimento da massa colorada entre os pobres. O preço é este e está sendo pago. Enquanto isso, os irmãos Henrique Poppe Leão e Luiz Madeira Poppe se remexem nas tumbas.

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