terça-feira, 24 de agosto de 2010

Quando o futebol carioca era o Rei

No último fim de semana um compromisso familiar me levou ao interior do estado do Rio de Janeiro. Lá assisti o clássico entre Flu X Vasco num botequim lotado de gente, dividida entre as duas torcidas. O estádio estava lotado, a população mobilizada com o jogo, que foi bom, com muitas chances de gol, os times se alternando no comando da partida. Me lembrei de quando, naquele mesmo lugar, eu vivia uma das eras de ouro do futebol carioca: a década de 1980.
Se voce é mais jovem, e acha que o futebol carioca sempre foi inferior ao paulista, e que sempre perdeu e justificou as derrotas graças a uma mega conspiração comandada pelos paulistas para destruir o Rio, pode tirar o cavalinho da chuva. Não foi sempre assim. Na década de 1980 o Flamengo venceu quatro brasileiros, o Fluminense e o Vasco um cada. Como os outros quatro títulos foram divididos entre quatro estados diferentes (RS, PR, BA e SP), a hegemonia carioca nessa década foi brutal.
E não era só isso. A década teve grandes times no futebol carioca que protagonizavam clássicos memoráveis para 150 mil pessoas. O campeonato carioca era equilibradissimo, e enquanto os outros regionais do país (inclusive o paulista) confundiam todo mundo com uma profusão de fases, turnos, octogonais, etc., o carioca tinha uma fórmula simples e eficaz. Dois turnos disputados por doze equipes, os campeões dos turnos fazendo a decisão. Se houvesse uma terceira equipe com mais pontos que os campeões de turno na somatória geral, haveria um triangular final, para matar a todos do coração. E o equilibrio era tanto que isso acontecia com certa frequencia (1982 a 1985 e 1990).
E que times! O Flamengo de 1980, ainda basicamente o tri do final dos anos 70, depois remontado para formar a base do supertime campeão da Libertadores e Mundial de 1981 e brasileiro de 1982/83, e depois novamente remontado para vencer a Copa União de 1987; o Fluminense, com seu time de garotos campeão de 1980, depois o timaço tri carioca e campeão brasileiro de 1984; o grande Vasco do final da década, campeão brasileiro de 1989; o ótimos times do Bangu e do América na primeira metade da década, ambos chegando em finais; e até o Botafogo, que andava muito em baixa, conquistou em 1989 o histórico titulo que encerrou 21 anos de jejum.
E a imprensa esportiva carioca da época era uma coisa de outro planeta, cheia de fantásticos jornalistas. Me lembro de um Fla-Flu em 1984 em que estávamos viajando e tinhamos de mudar as estações do rádio conforme uma saía do ar e outra entrava. Ouvi Waldir Amaral e João Saldanha na Rádio JB, Doalcei Camargo e Gérson na Tupi, José Carlos Araújo, Luis Mendes e Washington Rodrigues na Nacional e Jorge Curi e Rui Porto na Globo, uma coisa louca.
Em se tratando de futebol eu não tenho dúvidas de que, se houve uma década carioca, essa década foi a de 1980. Encerrada com o carioca de 1990, que terminou nos tribunais, já que Caixa dágua mexeu nas regras do torneio bem na hora de se jogar o triangular final, num casuísmo para beneficiar o Vasco de Eurico Miranda. O Botafogo, nessa regra inventada, teria de vencer o Vasco para levar a partida para a prorrogação, enquanto o regulamento original previa uma decisão em que ambos partiam do zero. O Botafogo venceu, ignorou o novo regulamento, deu a volta olímpica, enquanto, um tanto constrangido, o Vasco fazia o mesmo. Os tribunais deram o título ao Botafogo, mas o mal estava feito. Naquele momento embaraçoso de duas voltas olímpicas simultaneas em que ninguem sabia quem era o campeão carioca já se podia advinhar tanto o declínio que viria como as causas dele.

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